O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) acolheu os argumentos do Ministério Público Federal (MPF) e negou recursos da União e da Fundação Nacional do Índio (Funai), em que pretendiam interromper a prestação de serviços de saúde e proteção social a trabalhadores indígenas do distrito Debrasa, em Brasilândia (MS), a 380 km de Campo Grande. O atendimento à comunidade, estimada em até 1500 indígenas, está sendo realizado por força de decisão liminar proferida em ação ajuizada pelo MPF.
A decisão, de 2012, também determinou que a Funai realizasse um estudo para obter maiores informações sobre a comunidade. Atualmente, a Fundação tem encaminhado um servidor para comparecer ao menos três dias por mês à comunidade, para receber as demandas e prestar apoio. A União presta serviço de saúde no local, por meio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), que também tem cumprido a determinação.
Contudo, tanto Funai quanto União recorreram da decisão, pois o mesmo pedido já havia sido negado anteriormente pela Justiça de Três Lagoas. O argumento usado pela Funai para deixar de prestar os serviços é que a assistência é dada apenas nas aldeias de origem e que a permanência dos índios no distrito é temporária.
Os índios trabalham na usina de açúcar e álcool Debrasa, nome que deu origem ao distrito de Brasilândia, a partir da fixação dos trabalhadores na região. Estima-se que estes indígenas, de várias regiões do estado, permanecem no distrito entre abril e dezembro, época da colheita da cana-de-açúcar.
O Ministério do Trabalho realizou inspeção em novembro de 2007 e constatou diversas irregularidades na empresa, que evidenciavam situações de trabalho precárias e degradantes, como falta de condições sanitárias no campo - não havia banheiros químicos -, ausência de assistência médica de urgência e de local de repouso no horário das refeições e falta de proteção contra a chuva. Era frequente até a falta de água potável.
Para governo, “possivelmente” havia atendimento
O argumento usado pela Funai para deixar de prestar os serviços é que a assistência é dada apenas nas aldeias de origem e que a permanência dos índios no distrito é temporária. O estudo determinado pela Justiça colheu informações sobre os indígenas que moram parte do ano na região, tais como número de pessoas; origem; vínculos com as aldeias; período de permanência no distrito; acesso ao registro civil e a benefícios previdenciários e sociais; dificuldades para retorno às aldeias de origem e acesso a alimentação e moradia. Os dados servirão de base para as ações sociais junto à comunidade.
Antes de ser obrigada pela Justiça a oferecer atendimento de saúde aos indígenas, a União ignorava a existência do distrito, argumentando que se tratava de uma “empresa particular sucroalcooleira”, que apenas emprega mão de obra indígena para o trabalho na monocultura da cana-de-açúcar. De acordo com o IBGE, Debrasa é um distrito do município de Brasilândia, onde existe a empresa de mesmo nome. Para o governo federal, o atendimento aos indígenas ocorria “possivelmente pela equipe de saúde contratada pela empresa”, evidenciando a falta de conhecimento sobre a situação.
Na própria ação acatada pela Justiça, o MPF argumenta que o índio não deixa de ser índio porque está distante da aldeia de origem: “O simples fato do indígena residir fora da aldeia durante parte do ano não faz com que perca sua identidade, devendo ser garantido o acesso aos mesmos serviços destinados aos seus pares. É inconstitucional qualquer distinção entre índios, especialmente quando esta pode trazer prejuízos aos direitos que lhes são conferidos pela Constituição Federal e pela legislação vigente”.
Soluções esquecidas
Em fevereiro de 2013, o Ministério Público Federal se reuniu com representante da Sesai, para que fossem apresentadas possíveis soluções definitivas para o caso. O chefe do pólo-base da Sesai em Brasilândia chegou a sugerir a possibilidade da criação de um serviço permanente de acompanhamento da saúde indígena no distrito, pois os médicos que realizam o atendimento se deslocam de Campo Grande todos os meses até o local. Na mesma época, surgiu a possibilidade da reabertura do escritório da Funai em Brasilândia.
Para o MPF, “Não só a população flutuante indígena do distrito Debrasa estaria atendida pelos serviços, mas também a comunidade indígena Ofayé-Xavante", que vive em aldeia próximo do município.
Contudo, após um ano e meio, nenhuma proposta de conciliação para o fim da situação dos indígenas de Debrasa foi apresentada formalmente ao MPF.